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Modelos operacionais orientados a produtos transformam a gestão de TI no Brasil

Dados de 2025 revelam que 72% das empresas brasileiras permanecem insatisfeitas com a maturidade em gestão de projetos, enquanto organizações líderes migram para Value Stream Management. A transformação PMO→VMO emerge como estratégia central para a otimização de investimentos de TI no planejamento 2026.

O cenário brasileiro de gestão de projetos de TI expõe contradições estruturais que demandam revisão urgente de modelos operacionais tradicionais. Enquanto o país registra crescimento robusto de 13,9% em investimentos tecnológicos, superando médias globais, organizações enfrentam um gap crítico de maturidade: 72% das empresas não conseguem atingir níveis satisfatórios em gestão de projetos.

Simultaneamente, dados revelam que 45,41% das organizações brasileiras operam sem estruturas especializadas como PMO (Project Management Office - Escritório de Gerenciamento de Projetos) ou VMO (Value Management Office - Escritório de Gerenciamento de Valor), enquanto 36,55% gerenciam mais de 20 projetos simultaneamente sem ferramentas adequadas. Esta fragmentação operacional evidencia limitações do modelo tradicional de "projetos" com início, meio e fim definidos, que impede a agilidade e a inovação contínua demandadas pelo mercado digital.

A alternativa estratégica consolida-se através de modelos operacionais onde TI é organizada em "produtos" duradouros, gerenciados por "fluxos de valor" que alinham permanentemente tecnologia aos resultados comerciais mensuráveis.

Diagnóstico operacional: sintomas da disfunção sistêmica

A análise crítica dos problemas estruturais revela sintomas específicos que permitem às organizações diagnosticar limitações do modelo tradicional. O primeiro sintoma manifesta-se na criação de "fábricas de features" (funcionalidades), onde equipes são medidas exclusivamente pela entrega de escopo técnico, desconectadas do impacto real nos negócios).

Pesquisas brasileiras mostram que 17,14% das mudanças de escopo decorrem de falta de clareza inicial sobre valor comercial, evidenciando desconexão sistemática entre capacidade técnica e resultados estratégicos. Esta fragmentação força investimentos em funcionalidades que jamais criarão diferencial competitivo significativo.

Os resultados da pesquisa divulgados pelo blog da Artia indicaram que o segundo sintoma crítico são os ciclos orçamentários rígidos, que impedem a adaptação estratégica. Dados indicam que 19,92% dos gastos adicionais em projetos brasileiros resultam de mudanças de escopo emergenciais, revelando que a rigidez orçamentária anual impede ajustes necessários durante a execução. Este modelo força as organizações a manter investimentos em iniciativas que perderam relevância comercial.

Paralelamente, a "amnésia organizacional" constitui o terceiro sintoma, resultante da formação e desmobilização constante de equipes temporárias. Esta rotatividade causa a perda sistemática de conhecimento sobre produtos e clientes, forçando o retrabalho infinito. Análisea no blog da Artia mostram que 15,8% dos problemas de escopo derivam de requisitos mal definidos, frequentemente resultado da ausência de continuidade cognitiva entre ciclos de projeto.

Arquitetura da transformação: pilares do modelo orientado a produtos

A revolução estrutural para modelos orientados a produtos exige mudanças organizacionais que desafiam décadas de pensamento gerencial tradicional. O primeiro pilar estabelece equipes persistentes e multifuncionais, organizadas em "squads" (pequenos times autônomos) de longa duração com autonomia completa sobre produtos específicos ou jornadas de cliente. Esta estrutura elimina dependências hierárquicas e acelera a tomada de decisão.

Análises da NTT DATA revelam que 75% das empresas já utilizam ferramentas de inteligência artificial generativa em fluxos de trabalho, enquanto organizações maduras implementam modelos de "venture capital interno", onde fluxos de valor competem por recursos baseado em métricas de impacto real. Esta abordagem darwiniana garante que apenas iniciativas com potencial genuíno de criação de valor recebam investimento contínuo.

O segundo pilar revoluciona financiamento através de Lean Portfolio Management (Gestão Enxuta de Portfólio), substituindo orçamento anual por projetos pelo financiamento contínuo de fluxos de valor. Esta transformação possibilita o planejamento trimestral adaptativo via QBRs (Quarterly Business Reviews - Revisões Trimestrais de Negócios), permitindo a realocação ágil de recursos conforme as prioridades estratégicas evoluem. Dados da NTT Data mostram que a simples redução de 30 minutos diários em tarefas repetitivas pode gerar uma economia superior a €1,5 milhão anuais para empresas com 1.000 colaboradores.

O terceiro pilar abandona o "triângulo de ferro" tradicional (escopo, tempo, custo) em favor de OKRs (Objectives and Key Results - Objetivos e Resultados-Chave) que conectam diretamente atividades técnicas com objetivos estratégicos corporativos. Esta mudança elimina o ativismo técnico sem propósito e canaliza a energia organizacional para resultados mensuráveis.

Value Stream Management: metodologia científica para otimização

O VSM (Value Stream Management - Gerenciamento de Fluxo de Valor) emerge como a ferramenta central para gerenciar os fluxos de valor de TI, fornecendo visibilidade completa desde a concepção de ideias até a entrega mensurável de valor ao cliente. O VSM é uma representação visual do fluxo de materiais e informações que serve para identificar desperdícios e oportunidades de melhoria em processos.

O mapeamento de fluxos de valor funciona como um diagnóstico organizacional, expondo os desperdícios através de análise visual de processos completos. Segundo ao blog da Artia, a metodologia identifica sete categorias de desperdício: a movimentação desnecessária, o inventário, a espera, a superprodução, o superprocessamento e os defeitos. No contexto brasileiro, onde 15,97% dos atrasos decorrem de aprovações burocráticas e 14,06% de dependências de terceiros mal gerenciadas, o VSM oferece um framework (estrutura de trabalho) estruturado para a eliminação sistemática destes gargalos.

As aplicações práticas do VSM no Brasil demonstram resultados mensuráveis em diversos setores. A metodologia permite às organizações identificar oportunidades de melhoria significativas nos relacionamentos com fornecedores, no fluxo de informações, na organização geral e na movimentação interna, resultando em redução substancial do lead time (tempo total desde solicitação até entrega). A implementação bem-sucedida da ferramenta demanda o envolvimento e comprometimento de equipes multidisciplinares, sendo recompensada através de melhorias que aumentam drasticamente a produtividade dos negócios.

As métricas de fluxo constituem o sistema de monitoramento do VSM: o Lead Time mede a duração total desde a solicitação até a entrega, o Cycle Time (tempo de ciclo) foca no tempo de processamento ativo, o Throughput (vazão) quantifica os itens entregues por período, e o WIP (Work in Progress - trabalho em progresso) monitora a carga de trabalho simultâneo. Estas métricas combinadas criam um dashboard (painel de controle) de inteligência operacional que permite a identificação proativa de bottlenecks (gargalos) antes que se tornem crises.

A evolução do PMO para VMO: transformação estratégica

A transformação do PMO (Project Management Office - Escritório de Gerenciamento de Projetos) para o VMO (Value Management Office - Escritório de Gerenciamento de Valor) representa uma mudança organizacional fundamental que transcende a nomenclatura. O VMO moderno opera como um catalisador estratégico de otimização, abandonando a função arcaica de controle de cronogramas para assumir o papel de facilitador que remove os impedimentos sistêmicos e garante o alinhamento estratégico contínuo.

As grandes corporações brasileiras já implementam os VMOs estratégicos: empresas como o Itaú Unibanco, o Mercado Livre, a Claro, o iFood, a Petrobras, a Yamaha, o BB Seguros, a Braskem, a Philips, a Dasa, a Copel e a Globo participaram do VMO Summit 2025, demonstrando a maturidade crescente na adoção de modelos orientados a valor. O evento reuniu os líderes para discutir os avanços na criação de valor através de iniciativas de projetos, processos e tecnologia.

A diferença fundamental reside na transição de mindset (mentalidade) financeiro: do orçamento fragmentado por projeto para o financiamento holístico das cadeias de valor que sustentam os produtos duradouros. Esta abordagem horizontal substitui a visão verticalizada tradicional, enfatizando o processo completo desde as definições estratégicas até a evolução perpétua do produto.

O VMO facilita a tomada de decisão através de recursos visuais intuitivos acessíveis aos stakeholders (partes interessadas) principais, mantendo a simplicidade informacional sem comprometer a profundidade analítica. Simultaneamente, desenvolve as competências em análise preditiva de valor, utilizando os dados históricos de fluxo para projetar o ROI (Return on Investment - retorno sobre o investimento) futuro das iniciativas, transformando as decisões de investimento de apostas intuitivas em escolhas baseadas em evidência.

Casos de implementação e tendências brasileiras

O mercado brasileiro apresenta exemplos concretos de transformação bem-sucedida. O Banco Itaú implementou chatbots (assistentes virtuais automatizados) com IA que resolvem 80% das solicitações sem s intervenção humana, reduzindo o tempo de resposta em 78%. A Magazine Luiza utiliza sistemas que cruzam dados sazonais e localização para sugerir produtos com 18% de aumento no ticket médio.

Tendências identificadas mostram que o PLG (Product-Led Growth - crescimento orientado por produto) será adotado por 95% dos provedores SaaS (Software as a Service - software como serviço) até 2025, evidenciando a consolidação de estratégias orientadas a produto. O PLG coloca o produto no centro da estratégia de crescimento, focando em criar produtos excepcionais que atraiam, engajem e retenham clientes organicamente.

Análises setoriais revelam que organizações brasileiras estão implementando metodologias híbridas (Agile + Waterfall), cultura de projetos com alinhamento organizacional, uso de tecnologias e dados para a tomada de decisão, inovação contínua e desenvolvimento de competências humanas essenciais. Aqui, Agile refere-se a metodologias ágeis de desenvolvimento, enquanto Waterfall é o modelo tradicional sequencial em cascata. O PMO Fórum 2025 destacou a transformação do PMO tradicional em agente estratégico de mudança.

Desafios e perspectivas da adoção nacional

A implementação no Brasil enfrenta desafios específicos relacionados à maturidade organizacional: 74,62% dos profissionais não possuem certificações específicas em metodologias modernas, evidenciando um gap (lacuna) de capacitação que impacta velocidade de transformação, de acordo com os dados da pesquisa divulgada pelo Artia.

Entretanto, o mercado brasileiro possui vantagens competitivas para a implementação acelerada. A juventude relativa do ecossistema tecnológico nacional significa menor legado de processos fossilizados comparado a mercados maduros. Startups (empresas emergentes de tecnologia) e scale-ups (startups em fase de crescimento acelerado) brasileiras já operam naturalmente com modelos orientados a produto, criando massa crítica de profissionais familiarizados com novas metodologias.

O futuro aponta a integração de plataformas VSM com inteligência artificial para a otimização preditiva de fluxos de entrega. Esta convergência tecnológica, incluindo DevOps (desenvolvimento e operações integradas), promete acelerar a transição para modelos operacionais científicos e orientados a dados, aproveitando investimentos crescentes em IA que caracterizam o cenário brasileiro atual.

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