Agentic Summit: 95% dos agentes de IA falharam em 2025 no Brasil por falta de governança e dados

No evento promovido por Go Enablers e Zaia, líderes de Eurofarma, Vitru, Leo Madeiras, Ambev, Claro, Startse e AI Brasil revelam que a maioria das iniciativas parou em pilotos sem retorno. A solução passa por capacitação profunda, infraestrutura de dados e governança multifuncional.

A frustração é generalizada entre líderes de tecnologia das maiores empresas brasileiras. A cada trimestre, conselhos e CFOs cobram retorno dos investimentos em inteligência artificial (IA). Mas a maioria dos projetos não sai da fase de piloto. O diagnóstico veio à tona no Agentic Summit – evento anual de Go Enablers e Zaia que reúne executivos para debater agentes de inteligência artificial autônomos em empresas – realizado na Fundação Armando Alvares Penteado, em São Paulo. Tiago Morelli, fundador da Go Enablers e Zaia, apresentou um dado alarmante: 95% das iniciativas de agentes de inteligência artificial (IA agéntica) lançadas em 2025 falharam antes de impactar o P&L, a demonstração de lucros e perdas que mede os resultados financeiros das companhias.

Dois painéis consecutivos, moderados por Déborah Oliveira (IT Forum) e Luiz Zaka (Drops), desvendaram por quê. O primeiro trouxe Erika Menezes (Eurofarma), Alessandra Reis (Vitru Educação), Celso Bueno (Leo Madeiras) e Fabiana Fagundes (FM/Derraik) para discutir a jornada do piloto aos resultados financeiros. O segundo reuniu Sergio Gaiotto (Claro), Tatiana Oliveira (AI Brasil), Felipe Ribbe (Ambev) e Gustavo Bodra (Startse) para analisar os desafios estruturais de 2026. O que emergiu não foi uma lista de problemas técnicos, mas um consenso perturbador: a barreira real é cultural e organizacional, não tecnológica.

O paradoxo da facilidade: por que criar agentes não garante impacto

Morelli apresentou um dado que parecia contraditório. Plataformas no-code permitem criar agentes sem programação em minutos. Mas 95% falham. A razão não é técnica: é que criar um agente é a parte fácil. Operá-lo, mantê-lo, integrá-lo à operação real é o trabalho duro. E ninguém foi treinado para isso.

Essa desconexão explica por que empresas como Ambev, com seis mil tarefas mapeadas, automatizaram apenas 12% de comunicações em vídeo e e-mail. Não por incompetência, mas porque Felipe Ribbe, da Ambev, cometeu um erro comum: focar em ferramentas em vez de processos. Depois aprendeu. O foco em eficiência operacional interna exigiu letramento de equipes, revisão de fluxos e, crucialmente, supervisão contínua. Isso liberou 40-50% do tempo de TI para tarefas estratégicas, mas o ganho veio da organização, não da ferramenta.

A mesma lição aparece em Vitru e Leo Madeiras. Alessandra Reis reduziu 70% do tempo de consultas para 13 mil parceiros. Mas só porque criou estratégia antes de investir: definiu público, entendeu regulação educacional, estabeleceu ritmo. Celso Bueno, na Leo Madeiras, priorizou copilotos em processos que mexem com lucro em lojas físicas. Não escolheu por hype. Escolheu por impacto financeiro.

A constatação é incômoda: a tecnologia não falhou. As empresas falharam em se preparar para a tecnologia.

Letramento: o problema invisível que atropela líderes

Menos de 1% dos executivos brasileiros tem formação técnica em inteligência artificial. Tatiana Oliveira, da AI Brasil, plantou essa bomba bem no meio do evento. A implicação é brutal. CEOs e CFOs não sabem distinguir chatbots simples de agentes autônomos complexos. Fabiana Fagundes, da FM/Derraik, deu um exemplo. Sócios de escritórios de advocacia chegam aos treinamentos achando que tudo se resume ao ChatGPT.

Sem essa base mínima, líderes não conseguem fazer três coisas críticas: priorizar investimentos, cobrar resultados adequados e reconhecer fracassos a tempo. Aprovam projetos por pressão de conselhos. Exigem retorno rápido. Encontram alucinações em cenários críticos e culpam a tecnologia, quando na verdade deveriam culpar a gestão.

Por isso Erika Menezes criou na Eurofarma um comitê multifuncional que questiona antes de aprovar: qual é o problema real? O que esperamos como solução? Quais são os indicadores de sucesso? Não é burocracia. É rigor. E Gustavo Bodra foi além, propondo algo radical: que inteligência artificial se torne agenda do CEO, não de áreas de inovação isoladas. Porque apenas assim lideranças ganham incentivos para se letrar e cobrar resultados.

Dados: a fundação invisível que empresas negligenciam

Sergio Gaiotto, da Claro, foi direto. Empresas sem jornadas de transformação digital anteriores carecem de lagos de dados estruturados. O projeto atrasa anos. Não é metáfora. É realidade. Tatiana Oliveira deu os números: iFood e Itaú levaram entre cinco e sete anos consolidando arquiteturas antes de aplicar inteligência artificial em escala.

Eis o problema: a maioria das empresas brasileiras criou pilotos de IA sem ter feito essa jornada. Tentaram pular etapas. Agentes generativos operam com modelos probabilísticos de linguagem. Sem dados organizados, produzem alucinações em cenários críticos. Em setores farmacêutico e educacional, alucinações geram riscos regulatórios. Em empresas de logística, penalizam a eficiência, como ocorreu no Mercado Livre. Encomendas entregues antes do prazo levaram ao bloqueio dos entregadores.

A implicação não dita, mas óbvia: você não implementa inteligência artificial generativa em 2025. Você implementa a transformação digital que deveria ter feito em 2015. Dez anos de atraso. Agora comprimido em meses.

Cultura: por que estruturas de inovação fracassam?

Gustavo Bodra da Startse fez uma afirmação provocadora: as áreas de inovação deveriam morrer. Não porque inovação não importe, mas porque estruturas isoladas não funcionam. Ficam espremidas entre pressão de negócio (entregar rápido) e limitações de TI (manter operação estável). Resultado: nenhuma autonomia. Nenhum poder de decisão. Apenas experimentos que não escalam.

Sergio Gaiotto completou: inovação depende de cultura, não de estruturas. E cultura vem da liderança. Por isso empresas familiares como Leo Madeiras e Eurofarma têm mais facilidade. Não por serem menores, mas porque decisões sobre experimentação vêm do topo. Celso Bueno, CIO da Leo Madeiras, defendeu o letramento desde acionistas até operação. Não é detalhe. É diferença entre fracasso e sucesso.

A conclusão incômoda: agentes de inteligência artificial não resolvem problemas de gestão. Amplificam. Uma empresa com cultura de experimento controlado gera 34% de aumento em conversões (Vitru) e 1% de margem adicional em lojas (Leo Madeiras). Uma empresa sem cultura gasta orçamento em protótipos que viralizam por erros.

Governança contínua: monitoramento não é opcional

Os agentes não são caixas-pretas resolvidas. Sergio Gaiotto comparou-os a bebês doentes: exigem monitoramento diário de métricas estatísticas para evitar desvios. Felipe Ribbe, da Ambev, apontou uma lacuna que ninguém fala em redes sociais: governança pós-automatização. Todos ensinam a criar agentes. Ninguém ensina a monitorá-los. Resultado: a proliferação descontrolada de soluções paralelas que ninguém governa (shadow IT).

Na Eurofarma, Erika Menezes criou o Grupo de Excelência em inteligência artificial generativa (IAGen), que reúne TI, segurança, jurídico para LGPD, marketing e gestão de mudanças. Isso equilibra ganhos rápidos (redução de custos administrativos) com apostas regulatórias (hiperpersonalização educacional com ROI projetado), e o ownership das áreas usuárias garante sustentabilidade pós-piloto.

O futuro: de 2026 em diante

O Agentic Summit posicionou 2026 como um ano de cobrança. Sergio Gaiotto sintetizou: até 2030, empresas sem cultura de modelos prescritivos (que recomendam ações baseadas em dados) enfrentarão obsolescência. Mas não será obsolescência tecnológica. Será obsolescência organizacional. Porque a tecnologia está pronta. As pessoas não.

Tatiana Oliveira reforçou: letramento em todas as camadas – conselho, diretoria, operação – habilita decisão segura. Gustavo Bodra propôs que a inteligência artificial suba à agenda do CEO. Porque quando é agenda de CEO, vira meta de negócio. E quando é meta de negócio, recursos e incentivos aparecem.

As perguntas estratégicas devem mudar: não "qual ferramenta uso?", mas "onde dói no meu negócio e a tecnologia viabiliza o quê?". No Brasil, colaboração entre transatlânticos (Ambev, Claro) e startups (Startse, AI Brasil) acelera maturidade, apesar de legados complexos. Fabiana Fagundes resumiu a realidade: resultado rápido e trabalho profundo são antagônicos. A coragem para encerrar os 95% que falham, priorizando os 5% que retornam investimentos totais, marca a diferença em um ecossistema volátil.

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