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Pix automático acelera transformação digital e exige preparação do ecossistema de TI brasileiro

A menos de duas semanas do lançamento operacional do Pix Automático em 16 de junho, empresas de tecnologia e instituições financeiras intensificam adaptações sistêmicas para incorporar a funcionalidade que promete revolucionar pagamentos recorrentes no país.

O Pix Automático representa um divisor de águas na evolução dos pagamentos digitais brasileiros, consolidando o país como referência mundial em inovação financeira. A funcionalidade será apresentada oficialmente em evento no dia 4 de junho, em São Paulo, com a presença do presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, mas entrará em operação efetiva apenas em 16 de junho, após conclusão da fase de testes que se encerra em 6 de junho. Com cerca de 920 instituições atualmente participantes do arranjo Pix e expectativa de ampla adesão à nova modalidade, o sistema promete automatizar cobranças recorrentes como mensalidades escolares, condomínios, serviços por assinatura e contas de consumo.

Esta transformação surge em um contexto de crescimento exponencial do Pix, que movimentou R$ 26,5 trilhões em 2024, representando crescimento de 54% em relação aos R$ 17,2 trilhões registrados em 2023. A modalidade automática elimina a necessidade de convênios específicos entre empresas e bancos, democratizando o acesso a pagamentos programados para negócios de todos os portes e acelerando a digitalização do ecossistema financeiro nacional.

Decifrando o Pix Automático: arquitetura, funcionalidades e regulamentação

O Pix Automático fundamenta-se em uma arquitetura transacional que exige autorização prévia única do usuário pagador, estabelecendo um ciclo automatizado para cobranças recorrentes com periodicidade flexível. Diferentemente do Pix Agendado Recorrente, onde o próprio usuário programa transferências com valores fixos e datas definidas, o Pix Automático permite que empresas enviem solicitações de autorização aos clientes, que podem aceitar débitos automáticos para pagamentos variáveis ou com frequência flexível. A funcionalidade opera exclusivamente para pagamentos de pessoas físicas para empresas com CNPJs ativos, oferecendo maior controle e transparência ao consumidor final.

O sistema permite configurar pagamentos com vencimentos semanais, mensais, trimestrais, semestrais ou anuais, sem limite de quantidade de agendamentos ou prazo máximo de vigência. O fluxo operacional inicia-se quando empresas enviam solicitações de autorização através do aplicativo bancário do cliente, que pode aceitar, definir limites de valor máximo e escolher se autoriza uso de crédito pré-aprovado como cheque especial. Após autorização concedida, duas tentativas de cobrança são realizadas no dia do vencimento, seguidas por até três tentativas adicionais em dias posteriores caso não haja saldo suficiente, conforme regras estabelecidas pelo Banco Central.

O impacto transformador do Pix Automático no ecossistema de TI e modelos de negócio

A implementação do Pix Automático cria oportunidades substanciais para empresas de tecnologia especializadas em soluções de pagamento e integração financeira. Segundo estudo da fintech Ebanx, a modalidade deverá movimentar US$ 30 bilhões em pagamentos de comércio eletrônico nos próximos dois anos, evidenciando o potencial transformador para prestadores de serviços de pagamento (PSPs) e desenvolvedores de software especializado. Esta projeção representa uma reconfiguração significativa do mercado de cobranças, que tradicionalmente dependia de boletos bancários e sistemas de débito automático convencionais com suas limitações de alcance e complexidade operacional.

Para empresas do varejo e prestadoras de serviços, a solução promete minimizar inadimplência e agilizar processos, oferecendo maior previsibilidade de fluxo de caixa. Lígia Lopes, CEO da Teros, empresa especializada em automação inteligente de processos via Open Finance, destaca que a digitalização financeira está em ritmo acelerado e que as empresas precisam ampliar seus menus de pagamento imediatamente. Segundo a executiva, além do Pix Automático, outras soluções já podem ser adotadas, como o Pix Parcelado e o Débito Automático via Open Finance, reduzindo a dependência de métodos únicos de pagamento e criando estratégias de retenção de clientes mais robustas.

Adaptação tecnológica essencial: preparando sistemas e infraestruturas

A centralidade das APIs constitui o pilar fundamental da adaptação tecnológica exigida pelo Pix Automático, demandando integração robusta com sistemas de gerenciamento de consentimento, iniciação de pagamentos automáticos e tratamento de notificações em tempo real. Os testes em andamento, que começaram em 28 de fevereiro e se estendem até 6 de junho, avaliam aspectos críticos como conectividade entre instituições, implementação técnica das APIs (interfaces de programação) e atendimento a requisitos de experiência do cliente (UX). Para as Iniciadores de Transações de Pagamento (ITPs), instituições reconhecidas pelo BC para iniciar pagamentos em nome do usuário, 13 entidades participam dos testes realizados pela Estrutura de Governança do Open Finance, com apenas aquelas aprovadas podendo oferecer o produto a partir de 16 de junho.

Empresas de tecnologia enfrentam desafios complexos na identificação automática, baixa e gestão de exceções para transações recorrentes, necessitando desenvolver sistemas de conciliação financeira capazes de processar volumes transacionais significativos com precisão e agilidade. A atualização crítica de ERPs, CRMs e plataformas de e-commerce requer incorporação de módulos especializados para gestão completa do ciclo de vida do consentimento do usuário, incluindo funcionalidades para cadastro inicial, alteração de parâmetros, suspensão temporária e cancelamento definitivo de autorizações. O Itaú, por exemplo, desenvolveu APIs customizadas com objetivo de facilitar jornadas de adesão, agendamento e conciliação, criando um hub de recebimento que centraliza em uma única tela pagamentos automáticos utilizando diferentes trilhos de cobrança. Angelo Russomanno, diretor de pagamentos para pessoa jurídica do Itaú Unibanco, comenta que a instituição identificou pontos de fricção e oportunidades de melhora no controle e experiência do usuário final durante os meses de preparação.

Imperativos de segurança no Pix Automático: mitigando riscos e assegurando confiança

A análise de riscos específicos do Pix Automático revela novos vetores de ataque que exigem estratégias de segurança diferenciadas, incluindo engenharia social direcionada para obtenção de consentimento indevido e comprometimento de credenciais de acesso às APIs especializadas. O cenário de fraudes no sistema Pix tem apresentado crescimento preocupante, com prejuízos atingindo R$ 4,9 bilhões em 2024, representando crescimento de 70% em relação aos R$ 2,9 bilhões registrados em 2023, conforme dados do Banco Central obtidos via Lei de Acesso à Informação. Estes valores referem-se às devoluções de valores solicitadas após fraudes constatadas, mas que não puderam ser retornados devido ao encerramento de contas ou falta de saldo, com 3,4 milhões de solicitações rejeitadas por esses motivos em 2024.

Os mecanismos de autenticação robustos exigem validação rigorosa da identidade tanto do pagador quanto do recebedor, implementando gestão segura do consentimento com opt-in explícito e granular. O sistema permite que clientes definam limites de valor máximo para cada autorização e escolham se permitem o uso de crédito pré-aprovado, oferecendo controles adicionais de segurança. A manutenção dos padrões consolidados de segurança do Pix, incluindo autenticação multifator, criptografia de ponta a ponta e rastreabilidade completa das transações, proporciona base sólida para a nova modalidade. As novas Instruções Normativas 613 e 614 publicadas pelo Banco Central estabeleceram mecanismos para lidar com falhas operacionais, permitindo reenvio de instruções de pagamento no mesmo dia da tentativa de liquidação, mantendo o valor original da cobrança.

Desafios antecipados na implementação e adoção em larga escala

A complexidade técnica da gestão de consentimentos, revogações e ciclo de vida das autorizações representa o principal desafio para implementação eficaz do Pix Automático. A necessidade de desenvolver interfaces intuitivas para usuários finais, mantendo simultaneamente robustez técnica para processamento automatizado, exige expertise especializada e processos operacionais redesenhados. O sistema de múltiplas tentativas de cobrança – duas no dia do vencimento e até três posteriores em caso de saldo insuficiente – demanda lógicas sofisticadas para gerenciamento de exceções e comunicação eficaz com usuários sobre status dos pagamentos. As instituições que disponibilizam contas transacionais exclusivamente para pessoas jurídicas tiveram prazo estendido até 6 de junho para informarem ao BC sua decisão de não ofertar o Pix Automático, evidenciando a complexidade das adaptações necessárias.

A análise dos custos envolvidos revela investimentos substanciais necessários em desenvolvimento de software, aquisição de tecnologias especializadas, integração de sistemas existentes e atualização de infraestrutura. Para empresas de menor porte, a democratização do acesso a pagamentos programados representa uma oportunidade única de competir em igualdade com grandes corporações, mas exige planejamento financeiro adequado para adaptação tecnológica. Denis Silva, CEO do Efí Bank, destaca que o Pix Automático chega em momento oportuno especialmente para provedores de internet, segmento que o banco atende em mais de 60% do mercado, oferecendo solução moderna que supera limitações do débito automático tradicional. A instituição criou um ambiente controlado (sandbox) para testes, ajustes e simulações, permitindo que empresas iniciem a integração antes do lançamento oficial.

Perspectivas futuras e sinergia com o ecossistema financeiro digital

O potencial de integração do Pix Automático com outras funcionalidades emergentes do arranjo Pix promete criar um ecossistema financeiro integrado e abrangente, consolidando a liderança brasileira em inovação de pagamentos digitais. A sinergia com o Open Finance Brasil possibilita a criação de produtos e serviços financeiros personalizados e automatizados, aproveitando a infraestrutura compartilhada para inovações disruptivas no setor de pagamentos. Para pagamentos com Pix Automático nos trilhos do Open Finance, o usuário sinaliza interesse no pagamento direto no aplicativo da empresa recebedora e é redirecionado para o aplicativo do banco, eliminando necessidade de leitura de QR Code ou inserção de códigos Pix Copia e Cola.

Jonatas Giovinazzo, presidente da Associação dos Iniciadores de Transação de Pagamentos (INIT), e Gustavo Lino, diretor-executivo da entidade, comentam que o processo de autorização é simples para o usuário, mas exigiu testes complexos com inúmeros parâmetros, passando pelo amadurecimento da estrutura do Open Finance e outras funcionalidades do Pix. A expectativa é de impacto significativo desde o primeiro dia de operação, com instituições engajadas e produto estruturado. Entre os setores que mais poderão se beneficiar – consumo, financeiro, educação e saúde – existe potencial de aumento de até 30% nos pagamentos ao utilizar solução de recorrência quando comparado aos pagamentos avulsos via boleto e QR Code.

Considerações para o ecossistema de TI brasileiro frente ao Pix Automático

A síntese dos principais desafios e oportunidades tecnológicas revela que o Pix Automático demanda adaptação sistêmica abrangente, desde infraestrutura básica até estratégias avançadas de segurança cibernética. A imperatividade de abordagem estratégica e proativa por parte das empresas de tecnologia exige planejamento antecipado e investimentos direcionados para adaptação tempestiva às novas funcionalidades. Com menos de duas semanas para o lançamento operacional, empresas que ainda não iniciaram os preparativos enfrentam pressão temporal significativa para implementação adequada, especialmente considerando que a oferta será obrigatória para instituições participantes na ponta pagadora, mas facultativa para empresas recebedoras.

O ecossistema de TI brasileiro encontra-se em momento decisivo, onde a capacidade de adaptação rápida e eficiente determinará o posicionamento competitivo no mercado transformado pelo Pix Automático. A preparação adequada dos sistemas e processos estabelecerá novos padrões de eficiência operacional e experiência do usuário no mercado financeiro nacional. Empresas que conseguirem equilibrar inovação tecnológica com segurança robusta garantirão vantagem competitiva sustentável nesta revolução dos pagamentos recorrentes, consolidando o Brasil como referência mundial em soluções de pagamento digital e impulsionando a digitalização contínua da economia nacional.

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